RECOMENDAÇÃO Nº 001 , DE 24 DE OUTUBO DE 2016
RECOMENDAÇÃO Nº 001 , DE 24 DE OUTUBO DE 2016
Dispõe sobre a atuação do Ministério Público de Contas no controle dos recursos vinculados e gastos mínimos em manutenção e desenvolvimento do ensino – MDE e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB.
O Conselho Nacional dos Procuradores Gerais de Contas (CNPGC), no exercício da competência fixada no art. 130 da Constituição Federal, em conformidade com a decisão plenária proferida na Sessão Ordinária realizada no dia 24 de outubro de 2016, nos autos da Proposição nº 001/2016;
Considerando que a educação é condição de concretização dos fundamentos e dos objetivos da República Federativa do Brasil, inseridos nos artigos 1º e 3º da Constituição Federal, sobretudo a dignidade da pessoa humana;
Considerando que a Constituição Federal, em seus arts. 6º e 205, determina que a educação é direito de todos e dever do Estado, devendo ser assegurada por meio de “ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas” na forma do seu art. 23, V e do caput do art. 214, em regime de colaboração e responsabilidade solidária, tal como se depreende da leitura conjugada do seus artigos 30, VI e 211;
Considerando que o dever estatal de manutenção e desenvolvimento do ensino – MDE visa, com a colaboração da sociedade, ao pleno desenvolvimento da pessoa, ao seu preparo para o exercício da cidadania e à sua qualificação para o trabalho, mediante o cumprimento dos princípios substantivos inscritos no art. 206 e das garantias operacionais de que trata o art. 208, ambos da Constituição Federal;
Considerando que a universalização de oferta, até este ano de 2016, da educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade é determinada pelo inciso I do art. 208 da Constituição, combinado com o art. 6º da Emenda Constitucional n.º 59/2009;
Considerando que o acesso à educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assim definida no art. 208, I da Constituição Federal constitui, nos termos do §1º do mesmo dispositivo constitucional, direito público subjetivo;
Considerando que o não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente (art. 208, § 2º da Constituição Federal de 1988 e art. 54, § 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente);
Considerando o dever de aplicação dos patamares mínimos de gasto em manutenção e desenvolvimento do ensino previstos no art. 212 da Constituição de 1988, bem como o dever de aplicação dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, de que trata o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT;
Considerando que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) regulamentou, em seus artigos 68 a 77, o dever constitucional de aplicação mínima de recursos governamentais em manutenção e desenvolvimento do ensino;
Considerando que a Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, regulamentou o FUNDEB, a que se refere o art. 60 do ADCT, delimitando seu regime jurídico notadamente quanto à composição financeira; à distribuição, à transferência e à gestão dos seus recursos, bem como quanto ao seu acompanhamento, controle social, comprovação e fiscalização;
Considerando que o dever de gasto mínimo em educação não se resume a aplicar formalmente os percentuais da receita de impostos e transferências previstos no caput do art. 212 da Constituição Federal, devendo, na forma do §3º do citado dispositivo constitucional, assegurar o atendimento das necessidades do ensino obrigatório, no que se refere à universalização, à garantia de padrão de qualidade e à equidade nos termos do Plano Nacional de Educação – PNE previsto pelo art. 214, também da Carta de 1988;
Considerando que a Constituição de 1988 identifica expressamente o conteúdo material das atividades de manutenção e desenvolvimento do ensino, para fins do art. 212, a partir das obrigações de fazer contidas nos princípios do art. 206, nas garantias do art. 208, nos dispositivos da Lei Federal no 13.005, de 25 de junho de 2014, e no rol de metas e estratégias do Plano Nacional de Educação, a que se refere o art. 214;
Considerando que a Lei Federal no 13.005/2014 estabeleceu o Plano Nacional de Educação, para o período de 2014 a 2024, a fim de regulamentar as obrigações normativas de fazer extraídas dos comandos constitucionais dos arts. 206, 208, 212 e 214, detalhando-as e operacionalizando-as temporalmente, na forma de um conjunto de (14) quatorze artigos, 20 (vinte) metas e 254 (duzentas e cinquenta e quatro) estratégias, a serem observadas pelos gestores de todas as esferas, sob pena de oferta irregular do ensino a que se refere o art. 208, § 2o da Constituição;
Considerando que a equalização de oportunidades educacionais e o padrão mínimo de qualidade do ensino são as finalidades fixadas constitucionalmente para balizar o dever de colaboração entre os entes da Federação, à luz do art. 211, §1o, donde decorre a responsabilidade solidária entre eles, caso restem – material e faticamente – frustradas a ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados de que trata o art. 75 da LDB e a cooperação técnica e financeira prevista no art. 30, VI da Constituição de 1988;
Considerando que o art. 4o, inciso IX da LDB (Lei no 9.394/1996) incluientre os deveres do Estado com educação pública garantir “padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem”;
Considerando que os recursos financeiros vinculados ao custeio do direito fundamental à educação devem, segundo o art. 69, §§ 5o e 6o da LDB, ser depositados em conta específica gerida pelo órgão responsável pela educação, na forma de repasses mensais inadiáveis e não suscetíveis de contingenciamento, que correspondam ao duodécimo das atividades públicas de manutenção e desenvolvimento do ensino, tal como tenham sido planejadas na lei orçamentária de cada ente;
Considerando que, de acordo com o art. 10 da Lei 13.005/2014, o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e os orçamentos anuais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios serão formulados de maneira a assegurar a consignação de dotações orçamentárias compatíveis com as diretrizes, metas e estratégias definidas no PNE e com os respectivos planos de educação, a fim de viabilizar sua plena execução;
Considerando que a Lei no 13.249, de 13 de janeiro de 2016, que institui o Plano Plurianual (PPA) da União para o período de 2016 a 2019, dispõe, em seu art. 3o, inciso I, que as metas inscritas no Plano Nacional de Educação são prioridades orçamentárias da administração pública federal durante o seu período de vigência;
Considerando que a Lei n° 11.738, de 16 de julho de 2008, regulamentou o art. 206, VIII da Constituição Federal, bem como a alínea “e” do inciso III do caput do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sobre o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica; de modo a fixar como dever da União a integralização do valor do piso nacional nos casos em que o ente federativo, a partir da consideração dos recursos constitucionalmente vinculados à educação, não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado;
Considerando que a Lei n° 11.738/2008, na fixação do regime de piso salarial a que se refere o art. 206, VIII da Constituição Federal, delimitou que a jornada de trabalho do magistério da educação básica deve ser cumprida, no máximo, com 2/3 (dois terços) da carga horária nas atividades de interação com os educandos, reservando-se o restante para atividades de planejamento e preparação pedagógica;
Considerando que os arts. 195, 198 e 212 da Constituição Federal operam como deveres estatais e também como garantias de financiamento mínimo, para que os orçamentos públicos não sejam omissos ou regressivos quanto à satisfação material dos direitos fundamentais, respectivamente, ao conjunto integrado de ações da seguridade social, à saúde e à educação;
Considerando que, sob o pálio da Constituição de 1988, as receitas vinculadas à seguridade social (art. 195) e os pisos de gasto em saúde e educação (arts. 198 e 212) são instrumentos de proteção orçamentário-financeira de direitos que não podem ser minorados ou negados;
Considerando que, a teor do art. 167, IV, em sua parte final, da Constituição, as vinculações orçamentárias asseguradoras de piso de custeio para os direitos fundamentais à saúde e à educação foram expressamente excetuadas do princípio geral de não afetação da receita de impostos, por força da sua condição de conteúdo mínimo de validade das leis orçamentárias anuais de cada ente da federação;
Considerando que, nos termos dos arts. 34, VII, “e”, e 35, III, as mencionadas vinculações constituem princípios sensíveis inscritos na Constituição Federal, cuja violação pode ensejar, respectivamente, intervenção federal nos estados e no Distrito Federal e intervenção estadual em seus municípios; durante a qual é vedada, nos termos do art. 60, §1o da CR/88, a apreciação de proposta de emenda constitucional;
Considerando que o comando de imutabilidade que confere máxima proteção aos direitos fundamentais (art. 60, §4o, IV da Constituição) também se estende às suas garantias estatuídas constitucionalmente, sendo esta a natureza jurídica das vinculações orçamentárias de receita e gasto mínimo protetivas da seguridade social, da saúde e da educação;
Considerando que o quadro de recessão técnica, pelo qual a economia brasileira vem passando desde o segundo trimestre de 2014, impõe severas restrições orçamentário-financeiras em todos os níveis da federação e que eventuais medidas de ajuste fiscal sobre as políticas públicas de saúde e educação não podem desconhecer ou mitigar, ainda que parcialmente, as vinculações orçamentárias fixadas constitucionalmente nos arts.198 e 212;
Considerando que o art. 9o, §2o da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), assegura que as despesas que constituam obrigações constitucionais e legais do ente não serão objeto de limitação de empenhos e de programação financeira, donde se revela desconforme com o ordenamento qualquer contingenciamento das despesas vinculadas ao piso consti-tucional em manutenção e desenvolvimento do ensino;
Considerando que o descumprimento do art. 212 da Constituição Federal, do art. 60 do ADCT, da Lei no. 9.394/1996, da Lei no 11.494/2007 e da Lei 13.005/2015 pode ensejar a responsabilização pela prática de ato de improbidade administrativa, a rejeição das contas anuais de governo e a intervenção de que tratam o art. 34, VII, “e”, o art. 35, III e o art. 36, III, da Constituição Federal, além de dar causa à suspensão das transferências voluntárias, na forma da alínea “b”, inciso IV, §1o, artigo 25 da LRF;
Considerando que o Supremo Tribunal Federal admite o controle judicial para conter arbitrariedades no custeio dos direitos fundamentais, tal como assentado na ADPF 45/DF, oportunidade em que o Ministro Celso de Mello afirmou que “não se mostrará lícito, contudo, ao Poder Público, em tal hipótese, criar obstáculo artificial que revele – a partir de indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa – o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência.”;
Considerando que o Ministério Público de Contas tem os deveres institucionais de defender a ordem jurídica e de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos à máxima eficácia do direito fundamental à educação, bem como pela garantia do seu financiamento estatal em patamares de gasto mínimo.
RESOLVE, respeitada a independência funcional dos membros e a
autonomia da Instituição:
Art. 1o Recomendar que as Procuradorias-Gerais de Contas empreendam esforços para a priorização do tema “Financiamento Constitucional do Direito à Educação de Qualidade” no planejamento estratégico dos Ministérios Públicos de Contas.
Art. 2o Recomendar que as Procuradorias-Gerais de Contas empreendam esforços administrativos e institucionais para dar apoio e fomentar a atuação dos membros do Ministério Público de Contas na defesa do custeio constitucionalmente adequado do direito à educação.
Art. 3o Recomendar que os membros do Ministério Público de Contas realizem ações coordenadas para evitar e reprimir quaisquer desvios e retrocessos quantitativos ou qualitativos no piso de custeio do direito à educação, acompanhando sua execução orçamentário-financeira e respectiva prestação de contas, por meio da avaliação dos instrumentos de gestão e de planejamento setorial na educação (Plano Plurianual – PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO, Lei Orçamentária Anual – LOA, Planos Nacional, Estadual e Municipal de Educação), dentre outros.
Art. 4o Para os fins previstos no artigo anterior, os membros do
Ministério Público de Contas poderão realizar ações coordenadas de preservação da
garantia fundamental de custeio mínimo do direito à educação, no sentido de:
I – representar aos órgãos competentes pela inconstitucionalidade de leis orçamentárias que prevejam gasto mínimo em educação inferior ao ditame do art. 212 da Constituição Federal;
II – fiscalizar e impugnar quaisquer formas de contabilização como manutenção e desenvolvimento do ensino de despesas manifestamente contrárias às diretrizes da LDB, notadamente em seus artigos 70 e 71; irregularidades na aplicação dos recursos do FUNDEB, especialmente, quando se verificar afronta aos arts. 21 a 23 da Lei no 11.494/2007, bem como irregularidades na aplicação da contribuição social do salário-educação;
III – questionar – com fulcro nos princípios da vedação de retrocesso e vedação de proteção insuficiente, bem como no art. 5o, §1o da Constituição Federal – a conformidade da previsão e da execução de quaisquer montantes de valores no orçamento dos entes que impliquem descumprimento do art. 212 da Carta de 1988 e do art. 60 do ADCT, a pretexto de ajustamento de gestão ou instrumento congênere com o respectivo Tribunal de Contas e/ou Poder Legislativo;
IV – demandar medida compensatória do déficit diagnosticado no parecer prévio do respectivo Tribunal de Contas e/ou no julgamento das contas pelo Legislativo, sob pena de suspensão de transferências voluntárias, na forma do art. 25, § 1o, IV, alínea “b” da LRF; intervenção na forma do art. 35, III da CR/1988 e responsabilização no âmbito do art. 1o, I, alínea “g” da LC 64/1990 e do art. 208, § 2o da Constituição de 1988, caso se verifique que a execução orçamentária deixou cumprir o patamar de gasto mínimo em manutenção e desenvolvimento do ensino em suas cinco vertentes, a saber:
IV.1. 18% (dezoito por cento) da receita resultante de impostos para a União e 25% (vinte e cinco por cento), ou percentual maior estipulado nas respectivas constituições estaduais e leis orgânicas municipais, da receita de impostos, incluídas a proveniente de transferências, para Estados, Distrito Federal e Municípios;
IV.2. aplicação integral dos recursos recebidos do FUNDEB na forma do art. 21 da Lei no 11.494/2007 e
IV.3. 60% (sessenta por cento) dos recursos recebidos do FUNDEB na valorização do magistério, nos termos do art. 22 da Lei no 11.494/2007;
IV.4. aplicação integral dos recursos arrecadados e distribuídos à conta da contribuição social do salário-educação, nos termos dos parágrafos 5o e 6o do art. 212 da Constituição Federal;
IV.5. destinação exclusiva para educação de 75% (setenta e cinco por cento) dos recursos previstos nos incisos I a II do art. 2° da Lei n° 12.858, de 9 de setembro de 2013, que dispõe sobre a destinação para as áreas de educação e saúde de parcela da participação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no resultado ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e gás natural, com a finalidade de cumprimento da meta prevista no inciso VI do caput do art. 214 e no art. 196 da Constituição Federal; assim como o cumprimento das vinculações específicas de receita da União estipuladas nos incisos III e IV do art. 2o da mesma Lei, aí incluídos 50% (cinquenta por cento) dos recursos recebidos pelo Fundo Social do Pré-Sal regulado na Lei n° 12.351, de 22 de dezembro de 2010;
V – recomendar aos Chefes de Executivo o depósito permanente – no respectivo fundo de educação, onde houver, ou em conta específica gerida pelo órgão da educação – dos repasses mensais inadiáveis e não suscetíveis de contingenciamento, que correspondam ao duodécimo das atividades de manutenção e desenvolvimento do ensino, tal como planejadas na lei orçamentária de cada ente à luz do art. 10 do PNE, no que se incluem as transferências de recursos no âmbito do FUNDEB, por força do art.69, §§5o e 6o da Lei 9.394/96;
VI – exigir dos Chefes de Executivo que a gestão do fundo/ conta específica da educação seja de responsabilidade exclusiva do titular do Ministério ou Secretaria de Educação, para impedir a multiplicidade de ordenadores de despesas da educação e a centralização e o controle operacional dos recursos vinculados à educação pelo Ministério ou pela Secretaria da Fazenda, bem como evitar o remanejamento das transferências de recursos do FUNDEB para a conta única do tesouro do ente, conforme o art. 69, §§5o e 6o da LDB;
VII – refutar a contabilização, pelo regime de caixa, das disponibilidades financeiras do fundo/ conta específica de educação e do FUNDEB que estiverem vinculadas às despesas empenhadas no piso constitucional em manutenção e desenvolvimento do ensino como um falseado saldo positivo parcial do resultado primário do ente;
VIII – recomendar a compensação, como aplicação adicional no exercício imediatamente subsequente, de quaisquer déficits de aplicação em manutenção e desenvolvimento do ensino, sob pena de responsabilização pessoal;
IX – refutar a classificação como “despesa obrigatória sujeita à programação financeira” e, por conseguinte, a inclusão das despesas vinculadas ao piso constitucional da educação ou amparadas pelos recursos do FUNDEB em limites de pagamento inferiores aos respectivos limites de empenho, na medida em que tal programação deficitária de pagamento atenta contra o fluxo tempestivo e regular de repasses de que trata o art. 69, §§5o e 6o da LDB e o art. 9o, §2o da Lei de Responsabilidade Fiscal;
X – demandar motivação circunstanciada dos gestores que derem causa ao agravamento dos indicadores de gestão, de avaliação institucional e de resultados em educação no âmbito de sua atuação governamental, para que se possa avaliar, diante das hipóteses de caso concreto, a necessidade de eventual responsabilização pela má ou ineficiente gestão dos recursos de manutenção e desenvolvimento do ensino e do FUNDEB;
XI – verificar se, a despeito do cumprimento contábil-formal do art. 212 da Constituição e do art. 60 do ADCT, houve o descumprimento de obrigações normativas de fazer, fixadas pelo legislador com prazo determinado de execução, hipótese em que cabe análise de eventual discussão de improbidade administrativa pela omissão na adequada aplicação dos recursos públicos educacionais diante do inadimplemento das metas e estratégias do PNE e do Plano de Educação do respectivo ente, cujo lapso temporal para seu atendimento já tenha se escoado;
XII – alertar aos gestores, por recomendação, que a omissão da União e dos Estados em assegurar assistência técnica e financeira, no exercício das suas funções redistributiva e supletiva para fins de equalização das oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade de que trata o art. 211, §1o da Constituição Federal, enseja responsabilidade solidária pelos sistemas de ensino demandados, para além do dever formal de colaboração entre eles, sob pena de lesão ao direito à educação pública de qualidade e ao pacto federativo, bem como de afronta aos artigos 23, V; 30, VI e 212, §3o, todos da Constituição de 1988, aos artigos 74 a 76 da LDB e ao art. 7o do PNE;
XIII – avaliar possível responsabilização dos entes federados que se omitirem quanto ao impositivo dever de efetiva assistência técnica e financeira, no exercício das suas funções redistributiva e supletiva para fins de equalização das oportunidades educacionais e garantia padrão mínimo de qualidade de que trata o art. 211, §1o da Constituição Federal, hipótese em que se insere a ausência de regulamentação do art. 74 da LDB e do art. 206, VII da Carta de 1988, nos termos em que determinam as Estratégias 20.6, 20.7, 20.8 e 20.10 do PNE;
XIV – recomendar ao gestor, no bojo das funções de controle interno de que trata o art. 74, I e II da Constituição Federal, que avalie, quantitativa e qualitativamente, a evolução intertemporal do processo de cumprimento das metas e estratégias previstas no Plano Nacional da Educação, em seus aspectos de governança, tempestividade e operacionais, de modo a assegurar a legalidade, legitimidade, eficácia, eficiência, efetividade e economicidade da aplicação dos recursos destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino e do FUNDEB, considerando-se – ao longo do processo – as avaliações e o monitoramento dos fóruns, conselhos de educação e demais instâncias de que trata o inciso XIX deste artigo;
XV – exigir que o gestor comprove anualmente a compatibilidade entre o PNE e os planos estadual e/ou municipal de educação, de modo a atestar também se as metas nacionais foram desdobradas adequadamente nos âmbitos estadual e municipal e nas respectivas leis orçamentárias de cada ente, na forma dos arts. 8o e 10 do PNE, hipótese em que deverá ser atestada a existência de dotações orçamentárias que permitam executar as diretrizes, metas e estratégias do PNE, notadamente por meio do teste de consistência do diagnóstico de beneficiários com os respectivos custos mínimos de alocação para satisfação suficiente das obrigações de fazer fixadas pela Lei no 13.005/2014 e na Constituição de 1988, em conteúdo e prazo;
XVI – priorizar o controle concomitante sobre a aplicação de recursos educacionais dos entes que não atingirem as metas e estratégias educacionais nos termos e prazos definidos legalmente, que não cumprirem com a aplicação do percentual mínimo de recursos de que tratam o art. 212 da Constituição de 1988 (ou respectiva Constituição Estadual ou Lei Orgânica, quando for definido percentual maior) e/ou, ainda, que não efetivarem outras obrigações de fazer que decorram dos comandos constitucionais;
XVII – recomendar aos gestores o acompanhamento da implantação do Sistema Nacional de Educação, previsto no art. 13 da Lei no 13.005/2014, na perspectiva do federalismo educacional que distribui competências e, concomitantemente, aloca recursos suficientes para a consecução das metas e estratégias o Plano Nacional de Educação de forma equitativa em todo o território nacional;
XVIII – fomentar o aperfeiçoamento da metodologia de lançamento,validação, comparabilidade e fiscalização dos dados disponíveis no Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Educação – SIOPE, em busca do seu cruzamento sistêmico com os dados apurados pelos Tribunais de Contas para fins de resolução tempestiva de eventuais divergências na análise dos gastos mínimos em educação e da aplicação dos recursos do FUNDEB;
XIX – exigir o regular e autônomo funcionamento dos conselhos e fóruns (municipais, estaduais e nacional) de acompanhamento e controle social da área de educação, para que lhes sejam garantidas condições materiais e finalísticas de cumprir tempestivamente seu papel institucional, avaliando, no mínimo, o perfil da sua composição, o número de reuniões realizadas no último período de 12 meses, a natureza do Conselho e do Fórum quanto à formulação dos planos e à gestão dos recursos da educação (se deliberativo, consultivo, normativo e/ou fiscalizador), sua capacitação periódica e a sua estrutura de apoio (importa saber, por exemplo, se o Conselho possui contador e recursos para formação e intercâmbio);
XX – exigir o cumprimento do art. 9o da Lei no 13.005/2014, que impõe ao Distrito Federal, Estados e Municípios o dever de aprovar leis disciplinando a gestão democrática da educação pública nos respectivos âmbitos de atuação, ou adequar, quando for o caso, a legislação local já adotada com essa finalidade, no prazo de dois anos contados da edição do PNE;
XXI – fomentar que as recomendações e ressalvas do controle social apresentadas pelo respectivo Conselho do FUNDEB, Conselho de Alimentação Escolar e Conselho Escolar sejam incorporadas, no que couber, como metas e balizas para a
educação estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias do ente;
XXII – propor que as conclusões dos conselhos sociais da educação operem como critérios de avaliação de programas do controle interno para fins de correção das falhas e aprimoramento do planejamento orçamentário e do planejamento educacional, na esteira do art. 74, incisos I e II da CF/88 e do art. 10 do PNE;
XXIII – propor, na forma do art. 11 e da estratégia 20.7 do PNE, a disponibilização de indicadores de rendimento escolar e de avaliação institucional para a aferição da qualidade do ensino e do gasto educacional, por meio da sua regular produção e atualizada alimentação dos bancos de dados do Ministério da Educação pelos gestores;
XXIV – verificar as efetivas conformidades formal e material entre o Plano de Educação, a Lei Orçamentária Anual – LOA, a gestão dos recursos recebidos do FUNDEB, as recomendações e ressalvas apontadas pelos conselhos de acompanhamento e controle social da área de educação e pelo respectivo Tribunal de Contas, bem como a aderência ao SIOPE e a própria aplicação do patamar de gasto mínimo em MDE como condições de manutenção do fluxo de transferências voluntárias para o ente, na forma do art. 25, §1o, IV, alínea “b” da LC 101/2000;
XXV – exigir que, enquanto não forem regulamentados os indicadores de gasto educacional previstos na estratégia 20.7 do PNE, os gestores federal e estaduais da
educação anualmente disponibilizem, em portal de domínio público na internet, parâmetros nacionais e regionais de preços referenciais de obras, equipamentos e materiais da área educacional, bem como sejam fornecidos plantas, projetos básicos e executivos padronizados para diferentes tipos e tamanhos de escola, com seus respectivos custos estimados e regionalizados;
XXVI – exigir dos gestores comprovação de que os gastos educacionais abaixo arrolados atendem aos parâmetros de legalidade, legitimidade e economicidade, na forma das seguintes diretrizes:
XXVI.1 – infraestrutura da rede de ensino acessível, sendo recomendável a existência de equipe própria, inclusive através de mecanismos de cooperação horizontal, para elaboração de projetos básicos e executivos de obras, bem como para seu acompanhamento e fiscalização, ao invés da sua terceirização;
XXVI.2 – transporte escolar, com a fixação de custo médio regional por quilômetro rodado, itinerários e horários a serem avaliados progressivamente de forma georreferenciada e consonância com as normas de trânsito brasileiras;
XXVI.3 – alimentação escolar, com parâmetros de consumo real e não estimado, distinguindo meses com aula e meses de férias, bem como mediante aferição de adequada logística de estoque, custo, validade e qualidade nutricional, levando-se em consideração as necessidades dos educandos em tempo integral;
XXVI.4 – livros didáticos e material de apoio, com a exigência de expressa motivação técnica pela assunção de custo pela aquisição de materiais similares aos cobertos gratuitamente pelo Programa Nacional do Livro Didático, levando-se em conta os critérios de eficácia, eficiência, efetividade, economicidade e legitimidade, bem como a garantia de “participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto
pedagógico da escola” e o dever de implementar “progressivos graus de autonomia
pedagógica e administrativa e de gestão financeira” às escolas, na forma dos arts. 14, II, e 15 da LDB;
XXVII – recomendar que o controle interno de cada ente promova a análise de licitações e contratos de aquisição de bens, prestação de serviços e obras conforme a sua aderência finalística, temporal e substantiva ao cumprimento das metas e estratégias do Plano Nacional de Educação, devendo ser refutada a contabilização em manutenção e desenvolvimento do ensino e na aplicação do saldo do FUNDEB de despesas, ainda que pudessem ser formalmente admitidas nos arts. 70 e 71 da LDB, as quais não sejam comprovadamente capazes de atender ao aludido Plano, que tem força vinculante por força do art. 214 da CF/1988;
XXVIII – acompanhar os atos de admissão de pessoal na área educacional dos entes, sobretudo as admissões temporárias de pessoal, à luz da estratégia 18.1 do Plano Nacional de Educação, tendo em vista a necessidade de progressiva composição, até 2017, do quadro docente por, no mínimo, 90% (noventa por cento) de servidores efetivos e de que 50% (cinquenta por cento), no mínimo, dos respectivos profissionais da educação não docentes sejam ocupantes de cargos de provimento efetivo e estejam em exercício nas redes escolares a que se encontrem vinculados;
XXIX – recomendar aos Presidentes de Casas Legislativas que o diagnóstico, feito em sede de parecer prévio pelo respectivo Tribunal de Contas, sobre eventual déficit de aplicação em manutenção e desenvolvimento do ensino e/ou déficit de aplicação dos recursos do FUNDEB, no exercício financeiro apreciado, somente seja refutado no julgamento das contas anuais de governo dos Chefes de Poder Executivo, mediante expressa motivação quanto a fatos relativos ao comportamento da receita ou da despesa do ente;
XXX – exigir que os chefes do Executivo, que nos termos do art.48, I, da Lei de Responsabilidade Fiscal, promovam o incentivo à participação popular e realizem, com ampla divulgação prévia, de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;
XXXI – exigir dos Chefes de Executivo municipais que promovam, nos termos do PNE, a busca ativa:
– de crianças em idade correspondente à educação infantil, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, preservando o direito de opção da família em relação às crianças de até 3 (três) anos;
– de crianças e adolescentes fora da escola, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, adolescência e juventude;
– de jovens fora da escola pertencentes a populações do campo, da região de menor escolaridade no País e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres, em parceria com as áreas de assistência social, saúde e proteção à juventude;
– para a educação de jovens e adultos, em regime de colaboração entre entes federados e em parceria com organizações da sociedade civil;
XXXII – exigir dos Chefes de Executivo estaduais que promovam, nos termos do PNE, a busca ativa:
– de crianças e adolescentes fora da escola, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, adolescência e juventude;
– da população de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos fora da escola, em articulação com os serviços de assistência social, saúde e proteção à adolescência e à juventude;
– de jovens fora da escola pertencentes a populações do campo, da região de menor escolaridade no País e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres, em parceria com as áreas de assistência social, saúde e proteção à juventude;
– para a educação de jovens e adultos, em regime de colaboração entre entes federados e em parceria com organizações da sociedade civil;
XXXIII – exigir dos gestores, nos termos da estratégia 7.35 do PNE, a regulação da oferta de educação básica pela iniciativa privada, de forma a garantir a qualidade e o cumprimento da função social da educação;
XXXIV – refutar a exclusão de despesas com terceirização de mão-de-obra do cômputo do limite de despesas de pessoal do ente, em afronta ao art. 18, §1o da Lei de Responsabilidade Fiscal, ainda que tenham sido contraídas com entidades do terceiro setor, como, por exemplo, organizações sociais e organizações da sociedade civil de interesse público.
Art. 5o Esta Recomendação entra em vigor na data da sua publicação.
Brasília – DF, 24 de outubro de 2016
CLÁUDIA FERNANDA DE OLIVEIRA PEREIRA
Presidente do Conselho Nacional dos Procuradores Gerais de Contas