O Ministério Público de Contas do Amazonas protocolou no início da tarde desta quarta-feira (4) um pedido ao Tribunal de Contas (TCE) para que sejam rescindidos os contratos com duas empresas que administram os presídios do Estado. Segundo o MP, há indícios de irregularidades como superfaturamento, mau uso do dinheiro público, conflito de interesses empresariais e ineficácia da gestão.
O pedido de rescisão é para todos os contratos das duas empresas responsáveis pela gestão de seis presídios do sistema. O Amazonas registrou três rebeliões em unidades prisionais em menos de 24 horas, entre domingo e segunda-feira (2).
O MP diz que as empresas recebem valores muito altos por presos, que há suspeitas de que este dinheiro não foi empregado na infraestrutura e apoio aos detentos, que as mesmas empresas fizeram doações a candidatos nas eleições e que a Umanizzare Gestão Empresarial, que administra o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), onde uma rebelião teve 56 presos mortos na segunda-feira (2), é a empresa que mais recebeu recursos do estado em 2015.
Em nota, o governo do Amazonas informou ao G1 que a contratação da empresa para a co-gestão de seis unidades prisionais no estado foi feita por meio de licitação pública, e que ainda não foi notificado oficialmente sobre o pedido do MP de Contas – por isso, não irá comentá-lo (veja a íntegra no fim do texto). A Umanizzare divulgou nota lamentando a tragédia e afirmando que presta apoio às autoridades na investigação dos fatos.
R$ 4,7 mil por preso
Segundo o procurador de Contas Ruy Marcelo Alencar de Mendonça, o governo do estado paga à Umanizzare R$ 4.709,78 por mês por preso que está no Compaj, “sem a devida contrapartida de serviços proporcionais, inclusive por presos extras, que respondem por superlotação carcerácia, denotando assim intolerável conflito de interesses empresarial e má aplicação do dinheiro público”.
“Temos indícios de que o valor que se paga por preso é muito elevado, e os documentos que recebemos não demonstram contrapartida da empresa, tanto que o incidente que ocorreu mostrou a precariedade em que o presídio se encontrava. Já havia suspeita de descontrole e ineficácia dos serviços prestados”, disse o procurador Mendonça ao G1.
Ele alega que a rebelião no Compaj provocou repercussão mundial, inclusive com pedido da ONU para que providências sejam tomadas, e que já havia alertado, em junho e em dezembro de 2016, que havia suspeitas sobre os contratos e que o dinheiro não estava sendo empregado no presídio.
O presidente do TCE, conselheiro Erico Xavier Desterro e Silva, que estava analisando os dois outros pedidos de junho e dezembro, e ainda não tinha se pronunciado sobre eles, é quem deve analisar o novo pedido do MP sobre os problemas nos contratos.
A Umanizzare administra 5 presídios do Amazonas, e a Multi Serviços Administrativos a penitenciária feminina de Manaus. Juntas, elas receberam R$ 400 milhões em 2016 do governo do Amazonas conforme apuração preliminar do Ministério Público.
O MP vê outro problema nesta questão: a impossibilidade do governo transferir sua total responsabilidade da administração prisional para empresas, o que seria irregular, já que, conforme o parecer, é a responsabilidade do Estado.
Para a penitenciária de Puraquequara, a Umanizzare recebe R$ 3.555,52 por mês por preso; para o Instituto Penal Antônio Andrade, R$ 3.524,30 preso/mês; para o Centro de Detenção Provisória, R$ 4.650,41 preso/mês; e pela unidade prisional de Itacoatira, mais R$ 4.752,22 mensais por detento.
O motim no Compaj durou mais de 17 horas e, além dos 56 presos mortos, houve mais de 180 foragidos. A suspeita inicial da Seap e investigada pela polícia é que presos que integram a facção Família do Norte (FDN) atacaram supostamente membros da facção Primeiro Comando da Capital (PCC), em um novo episódio da guerra do PCC com o Comando Vermelho (CV) pela disputa do controle do tráfico de drogas nacional. (clique aqui para entender a disputa entre as facções e o que ela tem a ver com a rebelião em Manaus).
Alertas anteriores
No parecer, o procurador afirma que já havia apontado ao Tribunal, em junho de 2016, que havia indícios de irregularidades nos contratos do governo com a Umanizzare. Em 20 de dezembro de 2016, o procurador fez novo pedido ao presidente do TCE e relator do caso, conselheiro Erico Xavier Desterro e Silva, pedindo análise urgente dos contratos, afirmando suspeitas de “antieconomicidade” e pedindo prioridade para uma inspeção in loco no presídio e uma perícia detalhada nos contratos, suspeitos de superfaturados.
Não houve nenhuma posição do TCE sobre os dois pedidos feitos em junho e em dezembro que já demonstravam os problemas.
O MP pede agora, também, uma medida cautelar contra o secretário de Administração Penitenciária do Amazonas para que não renove os contratos com as empresas, o que iria ocorrer em breve, segundo o procurador.
Leia a íntegra da nota do governo do Amazonas
A Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) tem trabalhado fortemente em busca de melhorias no sistema prisional do Estado. Ações que se traduzem em mudanças nas estratégias e rotinas internas das unidades carcerárias, no reforço da segurança e da inteligência e, sobretudo, nas ações de ressocialização dos internos. Foi a partir das ações de inteligência que o Estado conseguiu identificar nove túneis no sistema prisional, ano passado, impedindo tentativas de fugas dos detentos.
A contratação da referida empresa para a co-gestão de seis unidades prisionais no Estado, sendo 5 delas em Manaus e uma na cidade de Itacoatiara, foi feita por meio de licitação pública. O objeto dos contratos, assim como os pagamentos feitos à empresa, estão à disposição dos órgãos de fiscalização e disponíveis para consulta no portal de Transparência do Governo do Amazonas (http://www.transparencia.am.gov.br/)
Sobre o pedido feito pelo Ministério Público de Contas (MPC), agora à tarde, o governo do Estado informa que ainda não houve a notificação oficial e, por isso, não irá comentar.
Com informações do G1.
Notícia publicada em 04/01/2017.