Procurador-Geral de Contas dos Municipios de Goiás defende maior integração entre os vários ramos do Ministério Público do Brasil
Brasília, 25/05/2017 – Bacharel em direito e economia, com especialização em direito público, ex-presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas – (AMPCON), entre 2007 e 2010, José Gustavo Athayde atualmente é o Procurador-Geral do Ministério Público de Contas dos Municípios de Goiás e o vice-presidente para a Região Centro-oeste do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Contas (CNPGC). Para o Procurador o estreitamento de laços com os demais ramos do Ministério Público é importante para tornar mais efetivos o trabalho no Ministério Público de contas. O site do CNPGC ouviu algumas opiniões do Procurador José Gustavo.
Quais as condições de trabalho dos Procuradores-Gerais da região Centro-Oeste?
José Gustavo Athayde – A ausência de autonomia orçamentária e financeira da Instituição Ministério Público de Contas faz com que ela dependa das Cortes de Contas para praticamente tudo. Onde a relação pessoal dos procuradores com os conselheiros é boa, melhores costumam ser as condições de trabalho. Onde não é, elas tendem a ser piores.
Independentemente de tais relações, contudo, o que mais tem comprometido as condições de trabalho, não só dos procuradores-gerais, mas dos demais membros da carreira, é a desproporção entre o número de magistrados de contas e o de procuradores. Nesse sentido, é importante destacar que nenhum Ministério Público de Contas da região centro-oeste possui membros na mesma quantidade de conselheiros ou de ministros. No sistema de justiça vale a máxima “pra cada juiz um promotor”, mas infelizmente isso não tem ocorrido, em regra, no âmbito dos Tribunais de Contas. Essa defasagem afeta as condições de trabalho, uma vez que, apesar de todo o esforço dos colegas para analisar os processos que são a eles submetidos, não deixa de ficar um tanto quanto comprometida a qualidade e a efetividade do trabalho.
Qual o maior desafio para a atuação dos Procuradores-Gerais do Centro-Oeste?
José Gustavo Athayde – O maior desafio é superar as dificuldades apontadas e buscar cumprir a contento nossa missão constitucional. São muitas as demandas da sociedade e a vontade é sempre atender a todas elas. Não sendo possível, é preciso saber eleger prioridades, além de trabalhar em conjunto com as demais instituições parceiras. Espaço interessante para tal atuação são os denominados fóruns de combate à corrupção (em alguns estados são utilizadas outras denominações) colegiados de que participam os mais variados órgãos e instituições, de todas as esferas, que tenham relação com o tema. Os resultados têm sido alvissareiros.
Importante também é o estreitamento dos laços com os demais ramos do Ministério Público Brasileiro, nossos principais parceiros, uma vez que sempre são identificadas outras áreas, além do tradicional combate à corrupção, em que também podemos e devemos atuar, tais como gestão fiscal, saúde, educação, meio ambiente, dentre outros.
Como repercutiu, na região Centro-Oeste, a prisão de cinco conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro e o que o senhor pensa em relação ao modelo de composição atual de conselheiros dos Tribunais de Contas?
José Gustavo Athayde – O ocorrido teve grande destaque, como não poderia deixar de ser. Inimaginável que uma instituição incumbida de fiscalizar a aplicação dos recursos públicos tenha quase toda a sua cúpula presa sob suspeita de corrupção. É óbvio que não se afasta a necessidade do respeito ao princípio da ampla defesa, mas o fato é que a credibilidade da instituição fica abalada.
Apesar do elogiável trabalho realizado nos últimos anos pela Associação Nacional dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – ATRICON, forçoso concluir que a imagem das Cortes de Contas perante a sociedade, de um modo geral, não é das melhores.
Quanto ao modelo, reconheço que dentre ministros e conselheiros de tribunais de contas há aqueles com perfil adequado para a função, ou seja, com preparo técnico e postura independente em relação à autoridade que os indicou. Acontece que a experiência revela, contudo, que tais casos não têm sido a maioria. A prevalência do critério político em detrimento do técnico pode ser apontada como a raiz dos casos recentemente divulgados pela imprensa. Digno de nota o fato de que a única conselheira do TCE/RJ sobre quem não pesam acusações de corrupção é oriunda do Ministério Público de Contas. É preciso, todavia, abordar a questão sem maniqueísmo, uma vez que desvios de conduta podem ocorrer em qualquer carreira. Parece ser consenso, entretanto, que o magistrado que ingressa pela via do concurso público tende a ser mais independente e preparado para a função do que aqueles indicados por critérios políticos.
Outro aspecto fundamental do modelo que precisa ser enfrentado é a autonomia orçamentária e financeira do Ministério Público de Contas, a qual não pode mais esperar, pelas razões já apontadas.
Importante registrar, finalmente, que a própria ATRICON reconheceu recentemente que o modelo está superado, tendo apresentado sugestões para o seu aperfeiçoamento.
Qual sua expectativa para a PEC-329?
José Gustavo Athayde – Minha expectativa é boa e o momento é mais do que oportuno. A divulgação do mencionado episódio do Rio de Janeiro parece ter impulsionado a tramitação da proposta na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. A viabilidade da aprovação vai depender, em grande medida, do apoio que conquistar perante a sociedade. Para isso é necessário que as pessoas tenham ciência de que as Cortes de Contas podem interferir diretamente em suas vidas, fiscalizando, com técnica e independência, a aplicação dos sempre escassos recursos públicos.
Apesar de alguns pontos polêmicos, vejo que o ambiente para a revisão do formato das Cortes de Contas é favorável. A discussão tem se dado de forma séria e madura, envolvendo todas as carreiras que compõem o sistema. O mais importante, e que pode ser considerado o primeiro passo para a reforma, é o consenso em torno da sua urgência. Se a ideia for bem trabalhada junto à sociedade, a proposta pode ser viável.
Alguma consideração final?
José Gustavo Athayde – As palavras são de agradecimento pelo espaço concedido para essas breves reflexões sobre importantes aspectos atinentes ao controle externo brasileiro. Sempre atual afirmar que não há nenhuma instituição pronta e acabada. A resposta à tão propalada “crise do Estado” passa por uma constante avaliação de suas estruturas. Não há espaço para soluções mirabolantes. É preciso reconhecer os pontos positivos e negativos das propostas em discussão, ampliar o debate, ouvindo todos os interessados e sobretudo ter como foco principal a sociedade, razão de existir de todo o aparato estatal.
O potencial colocado pela Constituição Federal no colo dos Tribunais de Contas deve ser melhor explorado, e isso somente ocorrerá se o modelo for repensado, sem preconceitos e apego a tradições. É fundamental que se reconheça o relevante papel do Ministério Público de Contas nesse espaço, dando-lhe a tão almejada autonomia, para que a sociedade seja representada à altura que merece junto ao controle externo. A propósito, não consigo deixar de me lembrar do verso do poeta “o novo sempre vem”. O diálogo ente todos os envolvidos é o caminho para que isso ocorra.