Auditorias pelo controle externo: uma alternativa para a crise do sistema prisional
Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira*
O país está alarmado com a crise do sistema prisional brasileiro, que registrou a morte de mais de 100 presos nos estados do AM, de RR e do RN, em menos de um mês. Além desses, registraram-se confrontos, rebeliões e/ou fugas na BA, em SC e em RO, no mesmo período.
Em razão desses graves fatos, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Contas (CNPGC), entidade que reúne procuradores-gerais de Contas (PGCs) do país (membros do Ministério Público de Contas que atuam perante o controle externo), reuniu-se e deliberou por adotar as seguintes estratégias de atuação: uma regional e outra nacional.
A primeira consistiu em uma ação concertada, que contou, inicialmente, com a participação dos ministérios públicos de Contas das regiões Norte, Centro Oeste e Nordeste, que protocolaram, por seus procuradores-gerais de Contas, simultaneamente, representações junto aos tribunais de Contas de seus estados, a fim de que sejam feitas auditorias, do tipo operacionais/de desempenho e de conformidade/legalidade, buscando refletir os principais dados relacionados com os sistemas prisionais respectivos, tais como estrutura e custos com material e pessoal/gestão, dentre outros. Posteriormente, a essa estratégia aderiram os estados da região Sul, cobrindo, desse modo, todas as reuniões que registraram focos de conflitos. Totalizaram-se, assim, 20 pedidos para a realização de auditorias.
Com essa ação, visa-se, pela primeira vez, tratar o tema auditado pelo controle externo, não apenas de forma pontual e local, mas regional, porque entendem os procuradores-gerais do Ministério Público de Contas que, nesta temática, o problema revelado não possui fronteiras e será mais eficientemente abordado, se as soluções englobarem a realidade de toda a região. Ao final, espera-se que os dados coletados sejam compartilhados e correlacionados entre si, tudo de modo a construir um ambiente totalmente voltado para a melhoria da gestão, do controle dos gastos e das receitas, que envolvem o sistema, e, de conseguinte, das políticas públicas, responsáveis por tratar a questão, inclusive, de forma preventiva e pós-repressiva.
A segunda estratégia consistiu em enviar representação ao Tribunal de Contas da União, conclamando aquela corte a fazer auditoria integrada, a partir de estratégias que trespassem a análise federal da questão, rumo a uma abordagem nacional, visando, igualmente, a melhoria do sistema como um todo e a adoção de padrões mínimos de segurança, controle e fiscalização, respeitando-se o pacto federativo constitucional.
As ações lograram adesões importantes. Nos âmbitos regionais, vários TCs já se engajaram. Na região Norte, busca-se, inclusive, a adoção de padrões mínimos para a realização dessas auditorias, facilitando a comunicação entre todos e buscando resultados homogêneos. No TCU, o ministro presidente defendeu a competência da corte, seguido pela ministra relatora dos assuntos da pasta do Ministério da Justiça. A Associação dos Membros dos Tribunais de Contas (Atricon), igualmente aquiesceu à iniciativa e recomendou aos tribunais de Contas que se empenhem, imediatamente, na realização dessas auditorias.
A expectativa, portanto, é positiva, com a previsão de conclusão dessa etapa no primeiro semestre de 2017.
Se é certo, como decidiu o STF na ADPF 347, que o “estado de coisas inconstitucional” do sistema carcerário brasileiro deve ser enfrentado não apenas por um órgão, mas, sim, pela pluralidade deles, o controle externo, a cargo dos tribunais de Contas, não pode afastar-se da discussão e deverá, assim, nos termos do artigo 70 da Constituição Federal, prestar sua relevante contribuição para o enfrentamento da crise que está posta.
*Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira é procuradora do Ministério Público de Contas do Distrito Federal, mestre em Direito Público pela UnB e doutoranda em Direito Sanitário pela Universidade Pública de Navarra (Espanha). É presidente do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais de Contas e associada do MPD.
Este artigo foi originalmente publicado no Conjur.